domingo, 10 de fevereiro de 2008

Fechando o verão...



Não dá pra resistir a essa vozinha (a dela) inconfundível, quase menina, mas vozeirão seguro; nem a esse grave delicioso de acompanhamento, do maestro, manso e envolvente. E o assobio dos dois, que se confunde com a flauta transversa.

Esse clip é o meu favorito com os dois, embora haja outros, um deles encantador, mas só com ela. Vejam só essa letra, só quem viveu nos trópicos e conhece a cultura brazuca é capaz de não se surpreender e usufruir do que parece, à primeira vista (ouvida?), um amontoado meio non-sense.

Águas de março
(1972) Letra e Música de Antonio Carlos (Tom) Jobim

É pau, é pedra, é o fim do caminho
é um resto de toco, é um pouco sozinho
é um caco de vidro, é a vida, é o sol
é a noite, é a morte, é um laço, é o anzol
é peroba do campo, é o nó da madeira
caingá, candeia, é o Matita Pereira
É madeira de vento, tombo da ribanceira
é o mistério profundo
é o queira ou não queira
é o vento ventando, é o fim da ladeira
é a viga, é o vão, festa da cumeeira
é a chuva chovendo, é conversa ribeira
das águas de março, é o fim da canseira
é o pé, é o chão, é a marcha estradeira
passarinho na mão, pedra de atiradeira

Uma ave no céu, uma ave no chão
é um regato, é uma fonte
é um pedaço de pão
é o fundo do poço, é o fim do caminho
no rosto o desgosto, é um pouco sozinho

É um estrepe, é um prego
é uma ponta, é um ponto
é um pingo pingando
é uma conta, é um conto
é um peixe, é um gesto
é uma prata brilhando
é a luz da manhã, é o tijolo chegando
é a lenha, é o dia, é o fim da picada
é a garrafa de cana, o estilhaço na estrada
é o projeto da casa, é o corpo na cama
é o carro enguiçado, é a lama, é a lama
é um passo, é uma ponte
é um sapo, é uma rã
é um resto de mato, na luz da manhã
são as águas de março fechando o verão
é a promessa de vida no teu coração

É pau, é pedra, é o fim do caminho
é um resto de toco, é um pouco sozinho
é uma cobra, é um pau, é João, é José
é um espinho na mão, é um corte no pé
são as águas de março fechando o verão
é a promessa de vida no teu coração

É pau, é pedra, é o fim do caminho
é um resto de toco, é um pouco sozinho
é um passo, é uma ponte
é um sapo, é uma rã
é um belo horizonte, é uma febre terçã
são as águas de março fechando o verão
é a promessa de vida no teu coração

É pau, é pedra, é o fim do caminho
é um resto de toco, é um pouco sozinho

É pau, é pedra, é o fim do caminho
é um resto de toco, é um pouco sozinho

Pau, pedra, fim do caminho
resto de toco, pouco sozinho

Pau, pedra, fim do caminho,
resto de toco, pouco sozinho

(1) Caingá - Madeira de lei do Maranhão
(2) Candeia - várias coisas: (i) espécie de lamparina; (ii) como o Caingá, madeira de lei que também tem propriedades medicinais.
(3) Matita Pereira é o nome verdadeiro do "Saci Pererê"

(4) Picada - caminho estreito, trilha, mas a expressão "é o fim da picada" foi muito usada no Brasil, nos anos 70, significando algo absurdo, inaceitável. Sabe Deus o que o Tom queria/quis mesmo dizer com isso.

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