terça-feira, 23 de setembro de 2008

Maria Keil - Será possível?

To: Metropolitano de Lisboa
Maria Keil (gosta que a tratem apenas por Maria) nasceu na cidade de Silves, em 1914. Partilhou a maior parte da sua vida com o arquitecto Francisco Keil do Amaral, com quem se casou, muito jovem, em 1933. De lá para cá fez milhares de coisas, sobretudo ilustrações, que se podem encontrar em revistas como a “Seara Nova”, livros para adultos e “toneladas” de livros infantis, os de Matilde Rosa Araújo, por exemplo, são em grande quantidade. Está quase a chegar aos 100 anos de idade de uma vida cheia, que nos primeiros tempos teve alguns “sobressaltos”, umas proibições de quadros aqui, uma prisão pela PIDE, ali... as coisas normais para um certo “tipo de pessoas” no tempo do fascismo.

Para esta “história”, no entanto, o que interessa são os seus azulejos. São aos milhares, em painéis monumentais, espalhados por variadíssimos locais. Uma das maiores contribuições de Maria Keil para a azulejaria lisboeta, foi exactamente para o Metropolitano de Lisboa. Para fugir ao figurativo, que não era o desejado pelos arquitectos do Metro, a Maria Keil partiu para o apuramento das formas geométricas que conseguiram, pelo uso da cor e génio da artista, quebrar a monotonia cinzenta das galerias de cimento armado das primeiras 19, sim, dezanove estações de Metropolitano. Como o marido estava ligado aos trabalhos de arquitectura das estações e conhecendo a fatal “falta de verba” que se fazia sentir, o Metro lá teve de pagar os azulejos, em grande parte fabricados na famosa fábrica de cerâmica “Viúva Lamego”, mas o trabalho insano da criação e pintura dos painéis... ficou de borla. Exactamente! Maria Keil decidiu oferecer o seu enorme trabalho à cidade de Lisboa e ao seu “jovem” Metropolitano.

Finalmente, a história! Recentemente a Metro de Lisboa decidiu remodelar, modernizar, ampliar, etc, várias das estações mais antigas e não foram de modas. Avançaram para as paredes e sem dizer água vai, picaram-nas sem se darem ao trabalho de (antes) retirar os painéis de azulejos, ou ao incómodo de dar uma palavra que fosse à autora dos ditos.

A parte “realmente boa” desta (já longa) história é que, ao contrário de quase todos os arquitectos, engenheiros, escultores, pintores e quem quer que seja que veja uma sua obra pública alterada ou destruída sem o seu consentimento, Maria Keil não tem direito a qualquer indemnização.
Pergunta-se “porquê? Porque na Metro de Lisboa há juristas muito bons, que descobriram não ser obrigatório pedir nada, nem indemnizar a autora, de forma nenhuma... exactamente porque ela não cobrou um tostão que fosse pela sua obra!!!
Este crime silencioso não pode continuar impune. Pior do que o crime em si será o (nosso) silêncio à sua volta.

Como tal os abaixo assinados exortam o Conselho de Gerência do Metropolitano de Lisboa a, rapidamente, deligenciar obter os desenhos dos painéis destruídos e mandar executar, à empresa que produziu (a Viúva Lamego) novos painéis.
Com todo o respeito, os abaixo assinados.

Retirado daqui, onde se pode assinar a petição.

Por favor, meus queridos portugueses, digam que isso é mentira.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Da cor do sol



Que Deus me dê, antes de morrer, os sabores da cor do sol. Do sol que arde no deserto dos homens azuis; do sol que paira sobre a Toscana dos muros ocres; do sol que banha o Mediterrâneo das casas brancas; do sol que brilha no Nordeste e faz as mangas serem tão perfumadas e doces que só de passar perto delas apetece não ser mais nada além de um ser vivo que pode se alimentar do cheiro e do sabor que elas guardam; do sol das laranjas de Allambra, das laranjas da Bahia, das laranjas que jazem numa banca à espera, em um frasco feitas cristal, com açúcar e magia e derretem na boca depois do jantar.

E que Deus me dê, igualmente, antes de morrer ( e mais algumas vezes antes disso, se possível) todos esses sabores e aromas e mais os do encarnado tomate seco ao sol, molhado no azeite, temperado com hervas e desejo. E que me dê, também, para acompanhar, a maciez do centeio feito pão, como nas serras da infância da minha mãe e que se possa regar tudo isso, com a dourada cerveja ruiva que os monges se encarregaram de nos deixar de herança, para não esquecermos que o estômago fica perto do coração e que os lábios saboreiam e beijam com a mesma saliva e intensidade.